Depois da cegueira, a lucidez… Será?

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Depois da cegueira, a lucidez… Será?

Não sei se na realidade a lucidez virá depois da cegueira. Mas, para o universo distópico criado por Saramago veio.

E se nós tivéssemos a consciência de que o poder está nas nossas mãos? E se nós entendêssemos que poderíamos cuidar de absolutamente tudo que envolvessem os nossos interesses? E se um dia nós não fossemos votar? Já parou para pensar nisso?

¨Mau tempo para votar, queixou-se o presidente da mesa da assembleia eleitoral número 14¨. É, ele tinha razão. Mau tempo para votar…. Essa é a primeira frase do livro que é literal e metafórica.

Bem simplificadamente, a história dá conta de uma classe política de determinada cidade se revoltando com 80% da população votando em branco, pela segunda tentativa em um pleito eleitoral. A primeira tentativa acontecera uma semana antes, em um dia de chuva torrencial, em que ninguém foi votar. Essa mesma classe política abandona a cidade, fechandos suas fronteiras e isolando aquele lugar sem nenhum serviço publico. Até a coleta de lixo é suspensa. Além disso, ela vai inflar os 20% da população contra os 80%. Familiar? Sigamos. A história vai se desenvolver nos reflexos desse panorama.

Mas, o que Ensaio sobre a cegueira e Ensaio sobre a lucidez têm em comum? Podemos dizer que o segundo é continuação do primeiro, o que a gente só consegue identificar, na segunda metade da leitura de Lucidez. Outra correlação interessante nessas histórias é que, embora elas façam pouquíssimas referências temporais, sem demostrar ao leitor em que momento elas acontecem, nós sabemos que Ensaio sobre a Lucidez acontece quatro anos depois da cegueira branca.

Na continuação, Saramago apresenta uma sociedade de uma cidade, que ele não nomeia, de um país, que ele também não nomeia, que está completamente esgotada de um governo alheio às necessidades da coletividade e que apenas um processo de lucidez poderia salvar aquela sociedade. Conseguimos dar nomes aos bois? Como José Saramago gostava de dizer, as palavras não são inocentes. E eu digo isso para mostrar que a ausência de nome dos locais e a ausência de tempo são estratégias para mostrar ao leitor que é uma história atemporal e que podemos democraticamente imaginar qualquer lugar para que isso aconteça.

Em Lucidez, há menos drama, mais sarcasmo e uma classe política bem caricata, divida entre os partidos de esquerda, de centro e de direita. A votação em branco certamente deve ser entendida como uma reação política ativa do cidadão e não como uma omissão.

Já em Ensaio sobre uma cegueira, conhecemos uma história extremamente dramática de uma cegueira branca que nos levou ao caos político e social.

A narrativa de Saramago imprime sempre um rito poético e, aqui, vemos isso também.

Destaque para como a ¨branquitude¨ nas duas histórias podem ser antagônicas e como o ¨esbranquiamento¨ inquieta Saramago.

*Assista aos dois vídeos que eu fiz sobre esses livros no canal Livros da Bela

Ensaio sobre a cegueira
Ensaio sobre a lucidez

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Ensaio Sobre a Cegueira
Ensaio sobre a Lucidez

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